Submetralhadora Bison – Test Drive

Publicado em: 31/10/2013

Categoria: DESTAQUES

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O Portal Defesa visitou a vizinha República Oriental del Uruguay após ter obtido a informação de que armas praticamente desconhecidas no hemisfério sul estão sendo introduzidas em serviço naquele país-irmão do Mercosul. Obtivemos não apenas o aval mas o decidido apoio do Ministério do Interior (que rege todas as atividades policiais – incluindo Inteligência Policial – e prisionais, de bombeiros e de emergências médicas no país). A primeira que escolhemos foi a que falaremos neste artigo, em forma de Test-Drive. Queremos ressaltar que estarão em pauta as características técnicas e operativas da arma, não as qualidades do autor como Atirador, de modo que o amigo leitor tenha uma idéia bastante clara do que deve esperar se tiver a oportunidade de operar com uma Bison.

Breve Histórico


A primeira versão desta arma foi desenvolvida na Rússia no início dos anos 90, apresentando desde o princípio o carregador cilíndrico, sistema obviamente inspirado na única outra arma similar que o autor conhece, a norteamericana Calico. Não obstante, ao invés de ficar no topo da arma, fica abaixo, servindo também como um confortável guarda-mão (telha). Com os anos foi evoluindo até o modelo que testamos, com muitas diferenças em relação ao original. Foi adotada apenas por algumas unidades de operações especiais russas e agora pelo Uruguay (existem rumores de que a Venezuela a teria adquirido mas, à falta de comprovação, deixemos como está). Na verdade fomos até lá para testar não uma mas três armas diferentes, com a opção de testar uma quarta (SVD) se houvesse tempo (e, “de brinde”, disparamos um carregador completo com a Glock, apenas para comprovar o que todo mundo já sabe: é uma arma soberba!). Não houve tempo para tudo, infelizmente, e vamos ficar devendo por algum tempo o Test Drive do SVD, mas pretendemos voltar). As armas foram as abaixo:


De cima para baixo, respectivamente, Vityaz, Bison e AK-103.


Algumas Características da arma que testamos:


  • Calibre: 9 x 19 mm (9 mm Luger/Parabellum);

  • Peso: cerca de 2 kg (sem o carregador);

  • Comprimento: 660 mm total, 425 mm com coronha rebatida;

  • Comprimento do cano: 225 mm (compensador incluído);

  • Carregador: feito de polímero, capacidade autorizada de até 54 cartuchos 9 mm P;

  • Funcionamento: blowback, disparando com o ferrolho na posição fechada;

  • Cadência Nominal: entre 600 e 700 disparos por minuto;

  • Velocidade de boca: cerca de 380 m/s.


Bison completa, seletor na posição semiauto.


A Arma


A primeira impressão que tivemos ao ver a Bison (sem o carregador) sobre uma mesa do Ministério do Interior foi a de estarmos diante de um AKS-74U ainda mais curto (ou, mais precisamente, encurtado) e com a parte inferior da telha (diferente da original; aliás, lembra um pouco a do FAL) faltando. Claro, sabíamos a razão mas a impressão foi essa. Após, já montado o carregador, ficou com a interface que conhecemos e que pode ser vista na foto acima. Notar que é puro AK, empunhadura, seletor de fogo, botões de desmontagem e dobra da coronha, gatilho, quase tudo. Aliás, a arma compartilha quase dois terços das peças com a citada família de fuzis, particularmente o AKS-74. O acabamento não é nenhum primor de beleza mas não vimos sequer traço dos horrores tão propalados sobre armas russas. A Bison foi feita para uso por Operadores, não tropas em desfiles…


Outro ponto é que a arma apresentava-se como claramente nunca usada, não havia a mínima evidência de disparo, como mudanças de cor na cobertura oxidada do compensador ou na janela de ejeção. O próprio carregador se encontrava em estado “out of the box” (recém saído da caixa), ausente qualquer sinal de ter sido sequer tocado antes. Ao manuseá-la, notamos logo que a tecla de seleção de tiro estava bem dura de operar, o que atrapalhou um pouco nas transições de regime de fogo durante a sessão de tiro real. Mas o autor logo encontrou uma alternativa bem interessante para isso, da qual falaremos mais adiante. Ainda sobre o compensador, pode ser removido e substituído (rosca e trava) por qualquer outro modelo da família AK e, naturalmente, silenciador (o autor prefere chamar de Redutor de Som, pois não torna a arma realmente silenciosa, apenas reduz e descarateriza um pouco o som do disparo), mais uma evidência de sua vocação para Operações Especiais. Detalhe do compensador e parte frontal do carregador:


Notar o eixo frontal onde se encaixa o carregador e o pino da trava do compensador.


Na desmontagem/remontagem, alguns problemas inerentes a uma arma provavelmente “zero km” apareceram com clareza: após o suave acionamento do botão traseiro que abre a parte superior da caixa da culatra, o retentor traseiro da guia da mola de recuperação (ambos, além da guia da mola, originais do AKS, podendo ser intercambiados sem problemas com a arma maior) se mostrou um tanto difícil de remover e recolocar, tão justo estava, além da “dureza” da mola, pelo jeito jamais acionada antes (ao final dos testes e após centenas de disparos, estas características praticamente não existiam mais, à exceção da resistência da mola, o que contribui sobremodo para a quase inexistência de recuo, mesmo em full auto). O ferrolho é uma variação do mesmo usado na família AK, com a diferença de ter a “cabeça” absolutamente lisa, sem os conhecidos lugs de trancamento, o que evidencia que a arma opera em blowback simples (ação direta dos gases para fazer recuar o ferrolho) ao invés do blowback retardado (como na citada MP-5), que retém o ferrolho por um curto instante após o disparo. Claro, também não está presente o sistema de pistão acionado por gases usado pelos fuzis, dada sua absoluta desnecessidade neste tipo de arma. Notar ainda que os comandos não são ambidestros, ficando a longa alavanca de seleção de regime de fogo apenas à direita e o botão que libera a dobra da coronha, à esquerda. Já o carregador é diferente de tudo o que o autor já viu/operou:


Carregador da Bison com munição 9 mm P. No detalhe, a alavanca giratória.



Notamos que desde seu preenchimento à inserção na arma os procedimentos são algo complexos mas, levando-se em conta que não é uma arma vocacionada para uso “normal” mas sim para Operadores de Equipes de Ações Especiais, não há problema aí, já que treinam muito. A adaptação aos novos métodos é rápida. Começa-se, após empunhar o carregador com a mão esquerda bem junto à parte posterior (a que é acoplada ao sistema de alimentação da arma) girando uma grande alavanca na parte frontal do carregador, ao mesmo tempo em que se pressiona com o polegar esquerdo uma tecla – que na foto acima aparece à esquerda do cartucho. Uma curiosidade: o autor, como qualquer ocidental, tende a girar no sentido horário. Isto manteve a alavanca imóvel; invertendo para o sentido anti-horário, passou a funcionar normalmente e com suavidade até a inserção do 54º e último cartucho, sem maiores variações (ao menos que o autor tivesse notado, apenas um leve e progressivo “endurecimento” do giro). Ao mesmo tempo, pressiona-se a tecla anterior até o fim do seu curso e, completado o giro necessário (uns poucos graus), afrouxa-se um pouco a pressão na tecla, o que mantém a bandeja na posição imóvel, com o espaço exato para a fácil inserção de um novo cartucho. Como dito, é um sistema diferente mas logo se “pega a manha” e a alimentação do carregador vai se tornando cada vez mais r
ápida e fácil. O (pouco) trabalho de adaptar-se a esta nova maneira de encher um carregador é sobejamente compensada, no entender do autor, pela confiança que sentiria ao se envolver em um combate tendo para pronto uso quase o dobro da munição disponível na maioria das outras submetralhadoras. A troca de carregador, após o Operador se acostumar, também é fácil e rápida, com a ajuda da macia porém firme tecla do retém.


Outra apresentação tão simples quão importante é a alavanca de acionamento, solidária ao ferrolho. O autor desconhece solução mais simples e econômica pois, além de acionar o ferrolho, ainda pode ser útil para solucionar panes de trancamento na alimentação. O sistema idealizado pelos norteamericanos em seu M-16A1 e inclusive utilizado no nosso IA-2, que começa a ser entregue ao Exército, o qual é composto por uma alavanca não-solidária e um êmbolo traseiro para tentar empurrar um eventual cartucho encravado, é apenas mais cara em número de peças, homens-hora para fabricação/manutenção e, portanto, aumenta o custo final da arma sem oferecer maiores vantagens, ao menos no entender do autor. Na Bison um incidente assim seria resolvido simplesmente ciclando o ferrolho com a alavanca: ou o cartucho seria extraído, inserido de maneira correta ou acabaria solto e, com o ferrolho aberto, cairia da arma com uma leve sacudidela, dando espaço à realimentação.


Detalhe da alavanca solidária ao ferrolho e seu longo curso. O seletor está em semi.


As posições da alavanca seletora de regime de tiro são apenas três: toda para cima, arma travada; toda para baixo, semiauto; e pouco acima desta última, fogo automático (rajada). A empunhadura e o carregador-telha são em polímero; o restante da arma, em aço, na maioria estampado. Também não há trilhos Piccatinny, já que os russos utilizam um sistema diferente, que consiste em uma peça em aço estampado que é afixada à esquerda da arma e utilizada para lunetas, miras optrônicas (dot), termais, OVNs, lasers, etc. Aparentemente o Uruguay não adquiriu equipamentos assim para esta arma; na verdade só vimos no SVD, por sua necessidade de luneta.


Finalmente, Tiro!


Como dito acima, o autor se preocupou exclusivamente com o comportamento da arma em si, sem se ater à precisão dos disparos, agrupamentos consistentes, etc. Para tal contávamos com colegas que se encarregariam dessa parte, sem se preocuparem com comentários sobre outros detalhes, a cargo do autor. Após o inevitável e necessário brifim com o Instrutor uruguayo, versando sobre aspectos de segurança e de como deveria correr o exercício (o que inviabilizou qualquer filme utilizável nesta matéria – estamos conversando sobre novo teste, desta vez possibilitando filmagens que possam ser postadas, o que, se formos bem sucedidos, necessariamente gerará um UPGRADE neste Test Drive). Completada esta parte, o autor passou à alimentação do carregador, como acima descrito. Finalmente, nos dirigimos à área de tiro. Ordem para inserir o carregador (encaixa-se primeiro a parte frontal, depois, em um movimento giratório para cima, o primeiro cartucho entra e, com um suave “clic”, a arma está carregada), o velho “tapinha” para cima, posição, ordem para destravar e selecionar semiauto, acionar a alavanca do ferrolho e finalmente, ordem para disparar.



O gatilho é suave e de curso agradavelmente curto e seco. Ao entrar em posição o autor notou que o CG (Centro de Gravidade) da arma se encontrava bastante à frente, tanto que na foto acima (início dos disparos) tentamos compensar posicionando o indicador mais adiante. De qualquer modo, CG à frente facilita muito a execução de sequências rápidas (como double/triple taps) sem elevação do cano, o que contribui e muito para a precisão. Sobre este quesito os colegas foram unânimes, é mirar e atirar que o acerto está garantido. Os estojos dos cartuchos deflagrados ejetam para cima e para trás. Já o autor se mantinha atento ao comportamento da arma, embora tenha observado as miras e considerado o enquadramento muito bom. Mas, como dito, não havia a preocupação com belos agrupamentos e sim a busca por características operativas da arma, principalmente peculiaridades, e o autor não se desapontou, tendo notado particularmente duas, além da já citada “dureza” do seletor, sendo algo difícil trocar de semi para full, a alavanca acabava subindo para a posição travada e, ao ser empurrada para baixo, voltava a semi. Isso aconteceu bastante com o autor e demais colegas nas primeiras sequências de disparos, desaparecendo gradualmente à medida que a arma “amaciava”. Algo frustrado, o autor finalmente conseguiu colocar em full e, mesmo solicitado a novamente trocar de regime, o manteve. Então, a primeira característica realmente interessante:


1 – O excelente gatilho, associado à (até certo ponto) baixa cadência de tiro permite, mesmo em full, a notavelmente fácil execução de disparos em semi e mesmo bursts de dois ou três disparos, sem maior necessidade de concentração. Como o autor é avesso a rajadas mais longas, isso foi o mesmo que estar no paraíso. Assim, quando comandado a disparar em semi, ignorava a alavanca seletora e simplesmente pressionava e imediatamente soltava a tecla do gatilho, produzindo um único disparo de cada vez, sem comprometer nem de leve a posição do cano em relação ao alvo e, portanto, a precisão. Esta técnica é uma das facetas da chamada “Controle de Gatilho”, praticada ao longo de vários anos em cursos e treinamentos pelo autor. Mas jamais havia funcionado de maneira tão natural e intuitiva quanto com esta arma, a primeira russa que testamos. Acrescentamos que funcionou igualmente bem com as demais. O cano se mantinha totalmente imóvel. Então…


2 – À medida que as sequências de disparos iam se sucedendo e o carregador cilíndrico de alimentação helicoidal ia rapidamente esgotando sua munição, o autor notou que o cano começava a elevar e torcer no sentido do raiamento (efeito muzzle), sendo necessário empunhar com mais força e mais à frente para compensar. Foi uma verdadeira curiosidade para o autor, este algo longo passeio do CG, que recuou de onde está a ponta do indicador do autor na foto acima até pouco atrás do dedo mínimo, e tudo isso em menos de um minuto. Esta característica confirma em definitivo a arma como específica para Operadores de Unidades Especiais, pois demanda muito treinamento não apenas para se obter mas para manter a proficiência no emprego eficaz da Bison.


Ademais, aquela conversa de que alavanca (lateral!) solidária ao ferrolho atrapalha a visada, pois o Operador a vê indo e vindo e tende a se desconcentrar, se revelou puro papo furado de quem não entende do assunto: o autor e demais colegas que operaram a arma sequer vislumbraram a alavanca (que, da mesma forma que a do seletor, fica apenas no lado direito) uma só vez, mesmo que de relance. A correta empunhadura também evita que a dita alavanca sequer chegue perto da roupa de quem estiver atirando. E tornamos a frisar, é uma arma para gente bem treinada


Conclusão


Foi um grande prazer ter testado esta arma. Ficamos todos impressionados com sua precisão, leveza e facilidade de operação do gatilho. A simplicidade do mecanismo interno também foi um ponto muito agradável. O fato de a arma ser nova em folha fez com que o autor temesse algum problema de alimentação (“engasgo”), temor que se revelou totalmente infundado: não tivemos nenhum incidente de tiro e éramos nada menos de quatro Operadores diferentes, a Bison “digeriu” direitinho toda a munição. Se nos restou algo a reclamar sobre ela, é apenas que não é operada no Brasil. Nossos agradecimentos e congratulações aos irmãos Orientales, por terem adquirido equipamento tão eficiente e, claro, por nos permitir que o testássemos. Muchas gracias!


Nota: a Bison não existe apenas em 9 x 19 mm mas também em .380 (9 x 17), 9 x 18 Makarov e finalmente uma versão em 7,62 x 25 Tokarev, esta bastante rara e com a peculiaridade de abandonar o carregador tubular em favor de um mais convencional (tipo caixa encurvada).


Portal Defesa

2 Responses to Submetralhadora Bison – Test Drive

  1. Victor disse:

    Qm sabe um dia quando eu for militar poder manusear algumas armas tão interessante come estas.

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