A ambição chinesa ou a descrença alheia?

Publicado em: 11/02/2014

Categoria: DESTAQUES

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Do Rio de Janeiro

Para qualquer um que olhasse para a Marinha Chinesa no início dos anos 90, a cena seria a mesma. Navios dedicados a funções específicas, com capacidades limitadas e obviamente pensados e operados para a defesa do território chinês.

Se uma pessoa que visse a Marinha descrita acima entrasse em coma e só voltasse a consciência agora em 2014, e olhasse para a mesma Marinha, talvez não manteria a tal consciência por muito tempo e cairia duro no chão.

É inegável o salto dado, assim como é inegável a mudança radical e extrema de postura e estratégia. Uma Marinha costeira, com navios adaptados, nascidos de projetos semelhantes e sem muita expressão, se transformou (ainda está se transformando na verdade) em uma Marinha de águas azuis. Uma Marinha com alcance e expressão oceânica.

J-15 - Foto: mil.cnr.cn

Várias foram as medidas adotadas pela China para que isso se tornasse realidade, e talvez a medida de maior simbolismo foi a aquisição em 1998 do Porta-Aviões ucraniano Varyag, sob o pretexto de ser transformado em um cassino. O que de fato ocorreu em 2011 quando foi concluída a reforma do ex-Varyag, agora Liaoning, no estaleiro de Dalian e o “cassino” foi ao mar realizar seus primeiros testes. Só esqueceram-se de avisar que o cassino seria para apostas diplomáticas internacionais, e não para meros jogadores milionários perderem dinheiro como em Las Vegas.

Totalmente reformado e modernizado, o Liaoning se transformou no primeiro Porta-Aviões chinês. E isso demandava treinamento e uma nova ala aérea. O treinamento teve uma “mãozinha” brasileira, com o acordo firmado em 2009 para a Marinha do Brasil fornecer treinamento de operações em Porta-Aviões para a Marinha Chinesa.

A nova ala esta vindo com a conclusão do desenvolvimento do caça J-15, “coincidentemente” um avião muito parecido com o Su-33, e com outros projetos como o de uma aeronave AEW muito similar ao E-2 HawkEye, porém ainda com os detalhes mantidos em segredo.

Além do Liaoning, submarinos nucleares, fragatas e corvetas modernas começaram a aparecer, e em grandes quantidades. E nesse embalo, por que não uma nova classe de Destróieres armados até os dentes? E nasce o Type 52D Luyang III, um navio de tímidos 156m de comprimento, com um sistemas de radares AESA muito similar ao AEGIS americano, armado com um canhão principal de 130mm, 6 tubos de torpedos, 1 sistema de mísseis CIWS FL3000N, dois canhões de 30mm controlados remotamente e 64 tubos de lançamento vertical com capacidade de disparar mísseis anti-aéreos, de cruzeiro, anti-navio, anti-submarino e anti-o que mais a China quiser atingir.

O primeiro, lançado em Agosto de 2012, deverá entrar em serviço este ano. Mais dois já foram lançados, de um total de 12 previstos.

Mas essas são apenas as ações de maior visibilidade que a Marinha Chinesa tem realizado nos últimos anos. É preciso entender que os vários lançamentos de novos navios, de todos os tamanhos, aeronaves novas e armas modernas, são resultados de uma mudança de característica da Marinha Chinesa que está em curso desde meados dos anos 90, mas que já havia sido vislumbrada desde meados dos anos 80, quando Liu Huaqing, comandante da Marinha Chinesa na época, afirmou que apesar da tendência (até então) da Marinha em continuar como uma força costeira, o crescimento econômico da China obrigaria a médio prazo a força a seguir para águas azuis, na medida em que seria expandida e modernizada.

E foi o que aconteceu. Uma força naval moldada por décadas na defesa territorial por herança da Guerra Fria, e o medo de uma invasão soviética, passou a olhar para o horizonte linear do oceano.

Type 52D - Foto: jeffhead

O Navy Military Art Research Institute, fundado em 1985 durante o comando de Liu, foi fundamental para essa transformação, na medida em que desenvolvia e aperfeiçoava doutrinas voltadas a dita expansão e modernização da Marinha Chinesa. A idéia era de que líderes são muito importantes, mas líderes vem e vão, daí a importância de um instituto para manter o padrão e o foco no desenvolvimento contínuo.

Esta e outras ações organizadas e sistemáticas, em consonância com o crescimento econômico da China, permitiram que as previsões do Comandante Liu começassem a tomar forma nas últimas décadas.

É inegável que a Marinha Chinesa já é uma força oceânica respeitada, com força de dissuasão considerável, e o maior exemplo disso foi a recente crise da Zona de Defesa e Identificação Aérea imposta pelo país sobre o Mar da China, em uma área tão extensa e com vizinhos tão militarmente relevantes que necessita de uma Marinha de águas azuis para que possa ser realizado o controle e se for o caso, alguma intervenção.

E como dito anteriormente, esta força está em processo de transformação. Ou seja, apesar de já ser uma força oceânica, ainda está crescendo. Um crescimento tão acelerado que chama a atenção de todo o mundo. Um relatório publicado no último dia 7, sexta-feira, pelo U.S. Office of Naval Intelligence, da U.S. Navy, revelou a preocupação dos Estados Unidos com esta expansão naval chinesa.

No relatório, que conta cada embarcação operacional na frota chinesa, deixa clara a preocupação com o crescimento acelerado da força de superfície e submarina. A operação este ano dos submarinos de mísseis balísticos da Classe Jin (Type 094) em missões de patrulha oceânica armados com mísseis nucleares foi destacada como um fator desestabilizador da região.

Type 094 Jin - Foto: Military-Today.com

Segundo a U.S. Navy, a Marinha Chinesa possui 77 navios de superfície, cerca de 60 submarinos de todos os tamanhos e tipos, 55 embarcações anfíbias e 85 embarcações armadas com mísseis, de todos os tamanhos, tipos e funções. Um número similar de novas embarcações foram lançadas, comissionadas ou tiveram suas quilhas batidas em 2013, e está previsto o mesmo número para 2014.

É um crescimento que assusta, um crescimento sem par na história recente, muito menos em um país que não está envolvido em nenhum grande conflito. Mas não é um crescimento inesperado. É uma evolução anunciada a cerca de 30 anos, e que por isso nenhum país pode se dizer surpreso, mas dizem. Aparentemente o “erro”, por assim dizer, dos demais países foi não acreditar que isso se materializaria. Mas olhem só que interessante…virou realidade!

Agora, ou os “Big Players” correm atrás do prejuízo, ou admitiremos que após anos de dominância americana e seus aliados, está se desenhando no horizonte um futuro em que os “donos do mundo” terão olhos puxados e uma bandeira vermelha.

Portal Defesa

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